Esquecendo por um momento o aumento de €23/mês português

O que os economistas americanos que subscreveram o manifesto para aumento do salário mínimo nos EUA nos dizem, é que partilham a visão empírica segundo a qual pequenas alterações no salário mínimo têm como consequência pequeno ou nenhum efeito no desemprego. Já percebemos que o mercado de trabalho não é, ou não tem sido, incrivelmente sensível ao preço desde que as mexidas sejam muito pequenas, ou melhor, modestas, para utilizar a expressão dos economistas citados. Nada de especialmente novo, e não se percebe muito bem o barulho que isto tem causado cá, sobretudo quando nos EUA o valor não era actualizado desde 1997 e, em termos reais, era inferior ao de 1951.

Mas no meio de toda esta discussão há 3 questões bastante importantes, a primeira se salário mínimo é salário mensal ou valor hora em contratos flexíveis? A segunda e terceira qual a queda salarial e de desemprego que existiria se o salário mínimo não existisse?

Como a esmagadora maioria das pessoas ganha mais do que o salário mínimo (o que deveria fazer seriamente pensar muita esquerda que parece não querer mudar de século), o acto de o baixar ou anular teria muito pouco impacto no rendimento e no emprego da população geral, mas teria algum impacto nalgumas pequenas franjas da população, nas quais se poderia constituir um incentivo algo perigoso para aderirem ou se manterem num qualquer programa de welfare ao invés de irem trabalhar.

Se se acredita na necessidade ou vontade de uma sociedade ser solidária ao ponto de defender a existência de um rede mínima de segurança, faz algum sentido criar um valor também mínimo de remuneração de trabalho que incentive as pessoas a sairem das redes de apoio social e a tornarem-se independentes, sem com isso sobrecarregar os empregadores. Claro que não há uma fórmula maravilha para esta visão, mas a ideia é que o valor mínimo de remuneração de trabalho seja efectivamente baixo e não muito distante do seu valor "natural" médio em caso de inexistência de obrigação legal, de modo a por um lado prevenir alguns abusos pontuais e por outro a não afectar o nível de emprego ao ponto da tentativa de retirar pessoas do welfare sair pela culatra.

A questão da forma salarial (mensal ou hora) é também estruturante nesta equação, e são dois paradigmas bastante distintos. Uma maior flexibilidade contratual facilita a entrada das pessoas de baixos rendimentos via uma maior adaptabilidade às necessidades concretas do empregador. Pode induzir uma maior rotatividade ou acumulação de empregos, mas aumenta o rendimento destas pessoas. Uma maior flexibilização laboral seria então uma óptima medida em conjunto com um salário mínimo aplicado em valor hora. Mínimo. Mínimo e baixo. Para enriquecer a sério as regras são outras.

(Pode-se acompanhar esta discussão no Blasfémias, Insurgente e no blogue da Lista E)
publicado por Manuel Pinheiro às 19:26 | comentar | partilhar