Eu tento

Eu tento.
A sério que tento.
Em nome da lealdade orgânica, da unidade do partido, do futuro da direita e até do bem da nação.
Finjo que não vejo. Finjo que não oiço. Finjo que emigrei durante dois anos para uma ilha no Pacífico. Ou que me tornei budista. No Tibete.
Se me cruzo com ele no jornal, mudo de página. Se me aparece na televisão, mudo de canal. Se o encontro na rua, mudo de passeio. Para não ver, não ouvir, não me dar conta de mais um dislate, de outra contradição, de novo soundbite a disfarçar o vazio.
Mas não consigo. Ele não deixa.
É mais forte do que ele.
É mais forte do que eu.
Depois do partido-empresa, das comitivas com dois ou três carros pretos para ganhar pose de Estado, de confiar as declarações programáticas a um jovem de grande futuro que não sabe quais são as nossas bandeiras porque "ainda não temos bandeiras" (sic), hoje ele vem dizer que os altos funcionários públicos não deviam falar à imprensa.
Talvez em nome da lealdade orgânica, etc.
Eu tento.
A sério que tento.
publicado por Pedro Picoito às 12:16 | partilhar