O Medo e a Crise

Da gravidade desta crise já ninguém duvida. Mas não consigo deixar de pensar que uma (boa) parte dos efeitos negativos que estamos já a sofrer, incluindo aquilo que decorre de um recuo tão repentino da procura agregada, tem uma motivação psicológica importante. Por outras palavras, os efeitos desta crise são também resultado de uma reacção de pânico que investidores, produtores, Estados e consumidores partilharam e ainda partilham. Por sua vez, o medo provoca os efeitos que o alimentam e justificam. Nada disto significa que a crise não é "real"; a sua realidade demonstra-se suficientemente nas falências, no desemprego, na queda do produto e do investimento. Mas a profundidade da crise deve-se sobretudo ao medo que penetrou na consciência de toda a gente. E, como Montesquieu ensinou, o medo paralisa.
O funcionamento normal de uma economia de mercado depende da confiança. Depende da confiança, não só entre os agentes, mas também na trajectória positiva do próprio sistema económico. Quando a confiança se desvanece, isso tem um reflexo automático nos comportamentos dos agentes, de todos os agentes. Ora, nunca houve uma crise que mobilizasse tantas horas de notícias negativas, de comentários pessimistas, de cabeçalhos catastróficos; como antes não havia canais informativos a funcionar durante 24 horas, como a Internet ainda não difundia informação instantânea por todo o mundo, era também mais difícil comunicar a crise a todos os cantos da economia.
Hoje em dia, é impossível não ficar deprimido quando nos expomos aos órgãos de informação nacionais ou internacionais para escutar tantas notícias desagradáveis. E quem duvida que a experiência afecta os nossos comportamentos "económicos"?
publicado por Miguel Morgado às 12:36 | comentar | partilhar