O Bloco de Esquerda e a retórica neo-nazi - com uma adenda respondendo a Filipe Nunes Vicente

No dia 28 de Janeiro, a Assembleia da República aprovou por unanimidade esta resolução. Os deputados associaram-se, assim, «à comemoração internacional lembrando e homenageando a memória das vítimas que pereceram» no Holocausto, consagrando-lhe o dia 27 de Janeiro, e assumiram «o compromisso de promover a memória e a educação sobre o Holocausto nas escolas e universidades, nas nossas comunidades e outras instituições, para que as gerações futuras possam compreender» as suas «causas» e «reflectir sobre as suas consequências.»

A proposta de resolução foi iniciativa do CDS-PP, e em particular do deputado João Rebelo. Todos os partidos discursaram e apoiaram sem reservas os termos da resolução. Quer dizer, todos, todos, não, exactamente.

Nem por uma vez a bancada do Bloco de Esquerda aplaudiu a apresentação da proposta de resolução, ou os discursos que a defenderam de todos os outros partidos. O Bloco de Esquerda primou pela silêncio, quando a Assembleia manifestava o seu apoio.

Mas não foi só. O deputado José Manuel Pureza falou pelo Bloco. O mínimo que se pode dizer do seu discurso é que foi um discurso cobarde. Na última frase pede que a memória do Holocausto não sirva para escamotear outros Holocaustos, forma (pouco) sibilina de reproduzir um tema tão querido à esquerda radical de hoje, convertida na principal trincheira da promoção do anti-semitismo dos tempos que correm: a obscena comparação entre o Holocausto e «a desgraça palestiniana», no conflito israelo-árabe.

A estratégia é clara: banalizar o Holocausto – a última criação (ou aproveitamento) do Bloco, nesta matéria, foi a cunhagem da inqualificável expressão Holocausto Haitiano –, ao mesmo tempo que, quando se concede a sua singularidade, é para, acto contínuo, imputar às suas vítimas, ou aos seus descendentes, a autoria de actos idênticos, estratégia em que a esquerda do Bloco de Esquerda ou José Saramago estão em perfeita sintonia com o neo-nazismo (cujos sites me escuso de lincar).

Ou o Holocausto não tem nada de especial, nada de particular enquanto tragédia – um Tsunami ou um Terramoto são equivalentes da barbárie hitleriana ou de Pol-Pot –, ou, se tem, os seus promotores vivos são os sobreviventes, ou descendentes, das fábricas de morte que se singularizaram pela designação «Holocausto».

As duas estratégias discursivas fazem, na aparência, curto-circuito. Fá-lo-iam, se de facto não as unisse a mesma motivação - o ódio anti-semita.

Em Portugal, com uma longa história de violenta perseguição anti-judaica, o Bloco de Esquerda sabe, como aconteceu no ano passado, onde se devem fazer as manifestações anti-Israel: no Largo de São Domingos, onde hoje está o memorial das vítimas da Inquisição, por ter sido daquele largo e da igreja que lhe dá o nome que durante séculos saíram tantas procissões para os autos-de-fé, onde se garrotavam e queimavam os criptojudeus.

Inquisidores, nazis, judeus e o Estado de Israel - são a mesma coisa, repetem, incansáveis, o Bloco de Esquerda e os seus aliados da direita neo-nazi. Ou, então, o Holocausto não tem nada de especial. Tudo depende dos dias. O propósito é que não muda.

Aqui está o texto de Irene Flunser Pimentel sobre uma parte da história do Holcausto, Auschwitz.


Mar Salgado - Filipe Nunes
Vicente: Um bom texto mas com um ponto contraditório. O Jorge Costa queixa-se da harendtização (sic) do Mal e depois utiliza o qualificativo "nazi" na descrição da retórica do Bloco.

Caro Filipe Nunes Vicente: não sei o que seja a arendtização do mal. A Banalidade do Mal, um conceito de Hannah Arendt, significa qualquer coisa à qual eu jamais aludi, nem no post que refere, nem noutro qualquer. É uma coisa altamente complexa, supõe primeiro ver o que é o Mal Radical kantiano e a forma como Hannah Arendt o interpreta nas Origens do Totalitarismo, coisa que, até agora, jamais fiz. Refiro-me sim, neste post, e agradeço comentário simpático que lhe fez, a um discurso aparentemente contraditório: o de destituir o Holocausto de qualquer significação relevante e o de atribuir às suas vítimas - ao povo judeu em geral e ao que, hoje, lhe é mais caro, o Estado de Israel - os crimes de que o Holocausto é responsável. Isso tem um nome: retórica neo-nazi. Infelizmente, por uma questão de informação, gasto mais tempo do que a minha saúde mental recomendaria a lê-la na internet. Não lhe sugiro que me siga o passo, nem ensino o caminho a ninguém:-)

publicado por Jorge Costa às 19:05 | partilhar