Sócrates, ontem, no debate, lá fez o seu número de virgem pequeno-burguesa chocada que, coitadinha, mal podia acreditar no que tinha escutado. Mau número. Se a gritaria se desse num palco, Sócrates seria homenageado com uma valente pateada e receberia em cheio os merecidos tomates volantes.
Desta vez foi Louçã o alvo (estupefacto) do chinfrim "socrático".
Trata-se duma metáfora idiota e miserabilista: a "Taxa Robin dos Bosques". Não me interessa agora se é justa ou injusta, inútil ou vantajosa para a generalidade do público (embora suspeite que o não é...). A propósito da alegada insuficiência da taxa, Louçã disse qualquer coisa do género: 'O verdadeiro Robin dos Bosques não se reunia com os ladrões dos castelos e dividia o roubo com eles - três para ti, um para mim.'
É claro que a imagem de Louçã não foi inocente. Nem o podia ser - se não, para quê dá-la? Mas Sócrates aproveitou o pretexto retórico e, de esguelha, não frontalmente, lá se meteu pela costura. Todos pudemos assistir à teatrada - os trejeitos indignados, as caretas assanhadas, o dedo tiranete espetado quando bradava banalidades como 'o insulto é a arma dos fracos!' (desde que a descobriu, que não se cala com aquilo) e chegou à desfaçatez de gritar para o outro 'tenha tento na língua, sr. deputado!'. A cegarrega lá continuou - e receio bem que tenha exagerado no número: prolongou demasiado a coisa, repetiu as tiradas escandalizadas para lá do suportável, isto é, somou ridículo ao ridículo. Parece-me que, a partir de certa altura, já ninguém conseguia ouvir o homem e todos estavam já incomodados com a cena.
Mas, na verdade, Louçã limitou-se a prolongar a metáfora - que Sócrates cria benéfica para si. A este caso, não se aplica o omne simile claudicat, mas apetece dizer omne simile mordet... Se eu me referir a um indivíduo como burro, estou a querer dizer que a criatura é um simpático quadrúpede de orelhas felpudas? Não. Quero dizer que é estúpido ou teimoso. Se eu disser que Sócrates saiu do debate a lamber as feridas, será que todos me vão saltar em cima acusando-me de lançar o boato dum acidente grave do primeiro-ministro e a calúnia duma sua curiosa parafilia? Se eu disser que Maria de Lurdes Rodrigues é uma harpia, quero dizer que se empoleira na Cinco de Outubro uma monstruosa criatura em topless, com corpo de abutre e que de mulher só tem a cabeça? Claro que não. Talvez pretenda que a personagem é malfazeja e grotescamente desagradável nas suas medidas. Sócrates faz autênticas palhaçadas? O quê, ele apresenta-se com uma bola vermelha no nariz e peruca cor de laranja? Ou trata-se das suas momices e gritaria pouco próprias? A generalidade do Grupo Parlamentar do PS parecia ontem um rebanho? Quer isto dizer que, de repente, no calor da tarde, por sádico milagre, os deputados se viram sufocados numa lã espessa enquanto baliam aflitos?