Quarta-feira, 01.10.08

Moral Hazard

Tem seguro contra todos os riscos no seu carro? Se sim, e por causa disso, espatifa-se propositadamente contra um muro? Tem seguro de incêndio na sua casa? Se sim, e por causa disso, brinca com gasolina na madeira envernizada do seu chão? A praia tem um nadador-salvador? Se sim, e por causa disso, vai-se meter directamente no meio das ondas com bandeira vermelha? Ao esticar o conceito de moral hazard até ao absurdo, e aplicá-lo assim mesmo à situação financeira que estamos a viver, é mais ou menos deste tipo de exemplos que estamos a falar. O conceito existe, é bem real, e deve ser tomado em consideração, mas não é um absoluto de 0 e 1, é apenas algo a ser ponderado e devidamente calibrado no puzzle global. Não faz qualquer sentido exagerar o efeito de moral hazard nem muito menos não o colocar em perspectiva. Alguém, no seu perfeito juízo, consegue ver aprovado um produto financeiro na administração de um banco com a seguinte argumentação: «É um produto de elevadíssimo risco, mas podemos ficar todos ainda mais milionários. Se não ficarmos, perdemos tudo, ficamos insolventes, fechamos operações no mundo todo mas não há problema porque a administração (vocês, nós) vai para a rua e somos fechados ou nacionalizados segundo o que a análise de conjuntura disser nesse dia».

Nos dias que correm, cada vez que alguém fala em moral hazard para justificar uma não intervenção, puxo da pistola.
publicado por Manuel Pinheiro às 12:51 | comentar | ver comentários (1) | partilhar

Perguntas

Desta vez Couric pergunta a Palin se esta lê jornais e revistas. Ficamos à espera da mesma pergunta ser colocada a Obama. Ben Smith, um democrata, toca no ponto: "another moment where it's not that her reaction isn't normal, but rather that she hasn't acquired the public figure's trick of smoothly turning the question if you can't answer it directly." Desta vez, aliás, Palin parece recuperar depressa da estupidez da pergunta e acaba por embaraçar Couric, que perde completamente a cabeça ao pedir uma terceira vez por nomes de revistas.


publicado por Joana Alarcão às 12:21 | comentar | ver comentários (17) | partilhar

Breve pausa nas eleições americanas para explicar a origem do mundo (II)



Tendo em conta o que disse atrás, vale a pena fazer três perguntas sobre o criacionismo de Sarah Palin e os seus alegados esforços para que o criacionismo seja ensinado nas escolas do Alasca. (Utilizo o adjectivo "alegados" porque alguma da informação que circula sobre a senhora é de tal modo absurda que, nas últimas semanas, adquiri o hábito da dúvida metódica.)

1. A primeira pergunta é se o criacionismo literal ou o até o intellligent design podem ser ensinados nas escolas públicas como uma alternativa científica ao evolucionismo.
Não, e por uma razão simples.
Tanto a crença na verdade literal da Bíblia como a crença num ser superior devido à perfeição do universo são matéria de fé. Convicções pessoais legítimas e respeitáveis, mas não hipóteses científicas. Se Sarah Palin alguma vez defendeu que o criacionismo fosse ensinado em tais termos aos alunos do Alasca, fez mal.

2. A segunda pergunta leva-nos mais longe. Há versões do evolucionismo que não se limitam a dizer que a ciência explica a origem e a evolução da vida, mas que Deus não existe porque a ciência explica a origem e a evolução da vida. Esta afirmação não é científica porque a existência ou inexistência de Deus não é matéria de ciência, mas de fé (ver ponto 1). Assim como nada prova a existência de Deus (as "provas " da apologética tradicional apenas "provam" que acreditar em Deus é uma hipótese racional), também nada prova a inexistência de Deus. Podemos acreditar ou não acreditar, mas a fé ou a falta de fé resultam sempre de uma decisão pessoal que não se baseia em provas físicas.
A pergunta é, pois, a seguinte: se o evolucionismo assume a posição ideológica de afirmar que Deus não existe e assim é ensinado, os crentes terão o direito de impedir que a escola pública agrida as suas convicções e o fundamento da educação que querem dar aos seus filhos?
A minha resposta é talvez.
Os crentes têm esse direito em nome da liberdade religiosa, têm até o direito de ensinar aos seus filhos que o mundo foi criado em seis dias ou que a beleza da criação prova a existência de Deus, mas não têm o direito de exigir que o ID ou o criacionismo literal sejam ensinados como um facto científico. Dou-lhes, porém, todo o meu apoio se decidirem combater o ensino ideológico do evolucionismo fazendo lobby sobre os poderes públicos, incluindo com a ameça legítima de votarem em quem muito bem lhes apetece e não em quem apetece aos prémios Nobel de Stanford e do MIT.

3. Segue-se a terceira pergunta, e a mais importante: pode alguém que acredita no criacionismo e defende que o criacionismo seja ensinado a par do evolucionismo nas escolas, ou pelo menos não se opõe a isso, ser candidato a Vice-Presidente dos Estados Unidos da América?
A minha resposta é sim, mil vezes sim, um milhão de vezes sim. Já deixei claro que compreendo as razões pelas quais alguém é criacionista. Nenhuma dessas razões põe em causa a democracia ou o respeito pelo sistema constitucional americano. Assim sendo, porquê invocar a ciência para combater politicamente quem tem crenças talvez erradas, mas legítimas? É intolerância mal disfarçada ou pura arrogância intelectual. Em qualquer dos casos, não é um argumento.
Admito que a crença na verdade literal da Criação bíblica seja um tanto ou quanto embaraçosa. Mas os políticos tendem a acreditar em coisas estranhas. O Obama, por exemplo, acredita que ninguém nota que ele é negro. O Al Gore acredita no aquecimento global. O Sócrates, até há bem pouco tempo, acreditava ser engenheiro. O Reagan acreditava no fim da União Soviética. O Churchill acreditava na derrota de Hitler. E assim sucessivamente. A democracia é o sistema em que indivíduos como Churchill, Reagan ou Sarah Palin podem vir a governar-nos.
Compreendo que isso não agrade a Palmira Silva, mas talvez seja pouco democrático passar um atestado de estupidez aos milhões de eleitores que tornam a coisa possível.
publicado por Pedro Picoito às 10:28 | comentar | ver comentários (21) | partilhar

Cachimbos

O Cachimbo de Magritte é um blogue de comentário político. Ocasionalmente, trata também de coisas sérias. Sabe que a realidade nem sempre é o que parece. Não tem uma ideologia e desconfia de ideologias. Prefere Burke à burqa e Aron aos arianos. Acredita que Portugal é uma teimosia viável e o 11 de Setembro uma vasta conspiração para Mário Soares aparecer na RTP. Não quer o poder, mas já está por tudo. Fuma-se devagar e, ao contrário do que diz o Estado, não provoca impotência.

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