Parece que há razões políticas, económicas e logísticas para que o euro não acabe. Em termos políticos diz-se que os governos europeus tudo farão para garantir a sua sobrevivência. Infelizmente, o euro tem sido a maior fonte de conflitos dentro da Europa, pelo que é duvidoso que mereça ser salvo. Para além disso, tivemos a cimeira europeia neste mês que não só não resolveu a crise do euro, como criou uma nova crise, na UE, que pode bem ter iniciado o fim desta. Em particular, temos assistido a uma posição alemã que não é a defesa firme do euro, nem o fim negociado do euro, mas um meio-termo onde não há qualquer virtude. O pior é que este meio-termo acarreta um risco muito elevado de gerar o pior dos cenários: o fim caótico do euro.
Diz-se também que o euro terá gerado grandes benefícios económicos, que não podem ser colocados em causa. Que benefícios? Onde? Uma coisa é clara, quer Portugal quer a Itália passaram a crescer pouquíssimo desde o início do euro. Aliás, Itália é, neste momento, o elo mais fraco do euro, porque não é salvável. A saída – intempestiva – da Itália provocará um tsunami financeiro que destruirá qualquer objecção logística ao fim do euro e que deverá contagiar outras paragens, leia-se Portugal.
O nosso governo até pode dar o seu melhor, diminuir os défices público e externo, inclusive através de medidas estruturais, mas isso não impedir que Portugal seja atingido por uma catástrofe europeia, com origem num qualquer outro país (e, infelizmente, o que não faltam são pretextos).
Curiosamente, neste mês a probabilidade de fim do euro como moeda portuguesa aumentou, mas o custo de se falar abertamente em planos de contingência diminuiu. A cimeira europeia deste mês, que se esperava decisiva e que esteve muito longe de o ser, aumentou por isso a probabilidade de o euro acabar.
Em contrapartida, na sua reunião deste mês, o BCE tomou, entre outras, duas importantes medidas. Por um lado criou linhas generosas de financiamento para a banca, num prazo inédito de três anos. Por outro lado, alargou o âmbito dos activos que podem ser dados como garantia para obter financiamento junto do BCE. Estas duas medidas significam que se se registar algum tipo de desvio de depósitos de bancos portugueses para outros bancos, instalados em Portugal ou não, os bancos nacionais têm agora uma enorme facilidade em substituir os recursos que possam deixar de estar disponíveis. Um dos maiores riscos de se traçar cenários, ainda que hipotéticos, de fim do euro é a possibilidade de isso gerar algum tipo de fuga de depósitos. Com as novas medidas tomadas pelo BCE, este eventual desvio de depósitos tornou-se muito menos preocupante.
Mas neste momento, apenas peço ao governo e ao Banco de Portugal que assumam que a probabilidade do euro deixar de ser a moeda em Portugal é de uns meros 10%, uma probabilidade muito inferior à que considero plausível. Para fazer face a esta eventualidade, deveríamos ter notas e moedas numa outra moeda.
Proponho que a nova moeda portuguesa, se o euro acabar, se chame “cruzado”, quer para evitar uma expressão muito comprida como “novo escudo”, quer para evitar confusões com memórias passadas de preços. O cruzado foi cunhado em Portugal entre os séculos XV e XIX (com abundantes referências nas novelas do Camilo) e também já foi usado no Brasil, entre 1986 e 1989.
As notas de 50€ representarão cerca de 18% da circulação de notas e menos de 1% dos montantes levantados no Multibanco, sendo o peso das notas de denominação superior quase insignificante. Ou seja, é essencial a emissão de notas de 5, 10 e 20 cruzados, sendo útil a emissão da nota de 50 cruzados, até porque a saída do euro seria acompanhada de uma significativa subida de preços.
Em relação às moedas, pode-se dizer que se daqui a dez anos o euro se revelar de boa saúde, então as moedas de cruzado poderão sempre ser fundidas e o metal reaproveitado para outros fins. O custo deste seguro seria ainda mais pequeno.
Não criar condições mínimas de resistência a um cenário de naufrágio, poderá provocar imenso sofrimento inútil, como o que se abateu também este mês sobre seis pescadores das Caxinas, por não irem equipados com um simples GPS, cujo custo era ínfimo.
[Jornal de Negócios]