O seu quintal

É impossível não se ficar boquiaberto com o mal disfarçado azedume (e agressividade) com que a Ministra da Educação, hoje, comentou a preocupação do Procurador Geral da República com as agressões que ocorrem nas escolas. Foi por alturas de (mais um) animado comício governamental – desta vez, proclamando os “progressos” na Educação – que teve lugar algures em Lisboa, acho eu.

Disse ela que há assuntos mais graves para o Procurador se preocupar [sic] – esta inacreditável arrogância (a roçar a má educação) só pode partir de uma pessoa que vê as escolas como o seu quintal. Como se as escolas fossem bolhas de realidade alheias à saudável aplicação da Lei. São os quintais privados da senhora. Mesmo que o fossem...

Alguém lhe devia recordar que ela, afinal, não passa de uma Ministra. Não, não é ironia. Repito: não passa de uma Ministra. Não é proprietária daquilo que governa. Prolongando a metáfora, ela não passa de uma caseira encarregada de cuidar do nosso quintal.
E má caseira. Deixa crescer as ervas daninhas em terra própria para boas culturas ao mesmo tempo que se encarniça cegamente, ajudada pelos seus dois sub-caseiros, a espalhar herbicida onde não deve: desta maneira, vai, com afã criminoso, queimando as melhores plantas do quintal, desde as maiores, que já davam bom produto e boa sombra, até às mais tenras, promessa de frutos mimosos. É uma caseira que vai deixar a nossa propriedade literalmente inculta.

Só mais uma coisa. A Ministra, no ataque ao Procurador, referiu-se, note-se, à violência sobre as crianças [sic]. Pinto Monteiro tinha sublinhado a violência sobre os professores. Há aqui uma escolha deliberada da Ministra. Ela pretende, assim, esbater o problema mais sério. É de longe bem mais grave, mais perigosa, a violência exercida sobre os professores por parte de pais e alunos do que a que acontece entre estes últimos. Só uma cegueira verdadeiramente criminosa permite ignorar uma evidência destas. Há aqui qualquer coisa de tremendamente errado.
publicado por Carlos Botelho às 22:09 | comentar | partilhar