Fim do euro (5) Dois fins

O fim das colónias e o fim do euro têm em comum o facto de quem tiver saído a tempo poderá sair incólume

 

A 25 de Abril de 1974, a revolução triunfou e Movimento das Forças Armadas (MFA) que a liderou conseguiu alcançar o seu objectivo de terminar a guerra colonial. O programa do MFA viria a assentar nos três DD: democratizar, descolonizar e desenvolver. Assim, desde o início do novo regime que ficou claro o objectivo de descolonizar, com a generalidade das independências dos novos países a ter lugar em 1975.

 

A generalidade das centenas de milhares de portugueses que se tinham instalado nas colónias desde 1961, início da guerra colonial, acreditou que poderia ficar nos novos países. Infelizmente, ainda antes da independência, estalou uma guerra civil em Angola, que foi tornando insustentável a permanência dos portugueses, que se viram obrigados a regressar a Portugal, em muitíssimos casos sendo obrigados a deixar todos os seus haveres para trás, porque mal havia transporte para as pessoas.

 

Ouvi falar no caso de um “retornado” que voltou ainda em 1974 (julgo que de Moçambique) e que trouxe tudo o que quis, não perdeu rigorosamente nada e, possivelmente o mais curioso, tinha vergonha de dizer que não tinha perdido nada. Ele era “retornado” como os outros, mas não tinha sofrido nem a guerra nem as perdas financeiras dos outros centenas de milhares, porque tinha saído a tempo.

 

Gostaria agora de estabelecer uma ponte entre o fim das colónias e o fim do euro. Há, desde logo, uma diferença abissal entre os dois casos. No caso das colónias, o novo regime assumiu, não exactamente desde as primeiras horas, mas passado pouco tempo, que queria dar a independência às colónias. Em termos legais, o sinal é dado de modo inequívoco pela Lei constitucional 7/74 (de 27 de Julho), que permite o reconhecimento das independências das colónias africanas.

 

No caso do euro, não só não há nenhum objectivo assumido de acabar com o euro, como todos os líderes europeus juram que estão dispostos a tudo para o defender, embora as suas palavras tenham quando vez menor credibilidade.

 

Esquecendo esta diferença de base, a partir daí faz sentido a analogia que primeiro vai haver um período em que se pode sair sem o mais leve problema, para depois se seguir um período altamente tumultuoso, em que as condições de saída se dificultam extraordinariamente e já quase nada se pode salvar.

 

Neste momento ainda estamos a viver este primeiro período do fim do euro, em que se pode tirar os euros de Portugal, até a tempestade passar, para depois os trazer de volta como divisas, que serão recebidas como algo precioso, que nos ajudará a retomar a normalidade, depois da saída do euro.

 

Daqui a alguns meses já podemos ter passado para a segunda fase, devido a problemas na Grécia ou em Itália, e já será tarde de mais para qualquer tipo de protecção.

 

Há muitas pessoas que continuam a recusar-se a contemplar a hipótese do fim do euro. Argumentam que isso traria tantos problemas que é algo que não pode acontecer. Mas há dois anos que os líderes europeus têm permitido que a crise do euro cresça em bola de neve, pelo que é possível que a partir de determinado momento já não seja mais possível suster a avalanche.

 

Os barcos tem embarcações salva vidas não porque acreditam que vai haver um naufrágio, mas como segurança para o caso disso acontecer. Podem olhar para as medidas de protecção contra o fim do euro nesta perspectiva de salva vidas. Se não chegar a ser necessário usá-los será óptimo, mas se for preciso usá-los e não os tiverem, arrepender-se-ão amargamente por isso. 

 

[Publicado no jornal "i"]

publicado por Pedro Braz Teixeira às 15:00 | comentar | partilhar