Pedro Panarra a 16 de Junho de 2012 às 11:24
Bom dia Victor,
Há em todo o caso uma incompreensão do enquadramento político da discussão deste assunto. A encruzilhada não tem que ver com este governo, mas diz respeito a toda a sociedade alemã. Os partidos da oposição converteram numa posição indiscutível a Energiewende . Para o SPD a mudança não está em discussão, pois foi o governo do SPD /verdes que a promoveu em 2002 numa versão mais radical e cuja concretização era mais rápida. Se um governo tentasse recuar nesta decisão política seria derrubada. Essa possibilidade não se discute
Para a maioria dos alemães isto não se trata de uma assunto técnico e somente de cariz económico, mas de uma decisão que diz respeito à vida da comunidade, logo uma decisão política. O Zé-da-esquina cá do sítio, o Hanswurst ou qualquer outra versão que se queira, tem opinião sobre o assunto e não admite que decidam por ele. Isto não é um assunto para decidir em Bruxelas. De sorte que a pergunta não é se avança ou não, mas como e quando avança. Qualquer governo está obrigado a fazê-lo e terá de tentar fazer as melhores escolhas.
O governo chefiado pela senhora Merkel em 2011 mudou a sua posição de abandono da energia nuclear (apenas um dos aspectos) não por um acto de singelo pragmatismo ou pata conquistar o "eleitorado" mas para para evitar o bloqueio político do país. A aceleração da política energética, que tem diversos aspectos, alguns dos quais muito felizes, teve relação com o acontecimento de Fukushima que despertou uma reacção de autodefesa -- com a nossa segurança e saúde não se brinca, um governo não tem o direito de decidir pelos cidadãos quando uma coisa destas está em causa- . Foi a mais surpreendente experiência política a que assisti, mas também motivada pelos antecedentes políticos, pois menos de um ano antes o governo em funções tinha reposto energia nuclear, revogando a legislação aprovada pelo governo de esquerda nove anos antes. sem a descrição da história política recente este modelo enrgético não é compreensível.
Quanto ao que dizem as empresas é preciso perceber que estas pressões fazem parte do jogo político e convém não absolutizar tomadas de posição, como faz no jornal I inventado a existência de planos grandiosos a partir de simples declarações. O Victor tem razão quando afirma que a sensibilidade à crise vai passar por aqui, mas por outro lado é uma opotunidade de fazer investimentos que "puxem" pelas economias do Sul da europa . Não há disponibilidade para outro tipo de obras públicas, que nem dependem do governo central. Lembremo-nos que a Alemanha é uma Estado Federal.
Cada comunidade política na Europa percebe os assuntos a partir de um ponto de vista político distinto, o que torna impossível a união ou a federação europeia . Para os verdes alemães esta é a melhor forma de defender a "Europa", para o Victor não é assim. Para os verdes franceses ou portugueses, coitados, não se sabe qual seria a melhor forma de a defender.
Obrigado Pedro,
pelo excelente enquadramento político que fez da questão - mas agora, é o actual Governo que tem o leme do programa. Também não tenho dúvidas que o Energiewende vai avançar (e que tem alguns méritos), a dúvida é se a trajectória planeada não terá que ser corrigida. Na Alemanha como em qualquer país os eleitores também votam com a carteira!
Carlos a 16 de Junho de 2012 às 21:40
O problema é de onde vem o gás... da Rússia. Para que o plano funcione teria de alterar as políticas globais de alianças, ou não?
Sim, em 2030 a principal fonte de energia na Alemanha será o gás natural, que será na sua maioria originário da Rússia.
A aliança já existe, a Rússia também está dependente do consumo alemão para desenvolver os projectos de extracção e os gasodutos.
lucklucky a 16 de Junho de 2012 às 14:55
"é uma opotunidade de fazer investimentos que "puxem" pelas economias do Sul da europa"
Um chorrilho de conversa fiada. O que interessa é os custos.
O que interessa é se é económico ou não para a riqueza com que os alemãs querem viver.
No fim o problema - a falta de energia- resolverá-se sempre com os alemães a pagarem para franceses e russos e quiça polacos e com alguns blackouts. Outros na mesma linha da loucura ambientalista são os Ingleses...
asCético a 16 de Junho de 2012 às 13:54
O comunismo não precisa de estar no poder para destruir a sociedade capitalista. Conseguem-no fazer muito mais facilmente, metidos no cavalo de tróia que é o ecologismo. Reparem como quase tudo o que se faça agora tem que ter a aprovação de organizações ecologistas. O auge foi atingido com as emissões de co2, pois este gás está presente em todas as situações da nossa vida. Controlando o co2, controla-se a vida das pessoas. A produção de energia é apenas um dos alvos. Chegará a altura de limitações aos transportes, à produção de carne ou à taxa de natalidade. O medo do aquecimento global está a produzir os seus efeitos. O novo medo a ser promovido será o da falta de água.
a empresa de produção de alumínio Voerdal (3ª maior da Alemanha) que emprega 400 trabalhadores queixa-se que os seus custos com a energia subiram mais de 40%
Trata-se de um caso particular, muito especial. A produção de alumínio utiliza balúrdios de eletricidade. Por esse motivo, as empresas desse ramo até se situam geralmente em países que, por motivos especiais (produção hidroelétrica), dispõem de eletricidade muito abundante e barata - Islândia, por exemplo. Faz pouco sentido, de qualquer forma, produzir alumínio na Alemanha.
O mercado não oferece remuneração suficiente, são necessários outros incentivos, algo semelhante a pagamentos por “serviços de garantia de potência”.
Esta frase é fortemente irónica. A troika pretende eliminar em Portugal estes mesmos incentivos que agora a Alemanha se prepara para introduzir. A razão é a mesma: as energias renováveis são fortemente intermitentes, pelo que é necessário possuir um grande número de centrais produtoras a gás disponíveis para ser ligadas nos (relativamente poucos) períodos em que a produção renovável é insuficiente. Mas é anti-económico construir essas centrais que apenas serão ligadas poucas vezes. Pelo que, são necessários subsídios.
Comentário geral: como sempre, ao abordar a energia nuclear, este post sobreestima os problemas do risco e subestima os problemas económicos, nomeadamente o problema da escassez de urânio. Ou seja, este post pretende que se vai desligar a energia nuclear por se temer os riscos dessa indústria, quando na verdade os peritos sabem muito bem (mas escondem da opinião pública) os verdadeiros problemas da sustentabilidade económica dessa indústria.
“Ouve o que eu digo e não olhes para o que eu faço”
A entidade reguladora alemã Bundesnetzagentur já admitiu, de alguma forma, a introdução dos pagamentos por garantia de potência – para incentivar as empresas a manterem algumas das suas centrais ligadas.
Pedro Panarra a 19 de Junho de 2012 às 10:37
Bom dia Victor,
O problema do eventual aumento dos custos associados às novas políticas de energia não terá influência directa nas eleições seguintes nem na percepção imediata da crise, embora venha a ser um motivo de discussão durante toda esta década. Só mais tarde as pessoas farão essas contas. Muitas pessoas estão dispostas a pagar mais (ou julgam que estão). O que pode vir a ser importante é a inflação globai para a qual este factor pode contribuir.A tolerância ao aumento do custo de energia difere um pouco de Portugal, pois existe uma considerável concorrência entre operadores que produzem e distribuem energia, por outro lado, a conta a pagar pelo do aquecimento (cuja fonte energética é o gás) é muitas vezes superior à da electricidade, etc. Quando mudei de operador que fornece energia em casa consegui poupar 30% na conta de electricidade. O empenho nas medidas de racionalidade energética nos apartamentos permite poupar na conta do aquecimento. São várias as possibilidades de diminuir a conta. Também me parece que o exemplo da Voerde não é muito rigoroso nem feliz, porque eles já tinham problemas há muito tempo.
O Victor parece supor que seria possível a tomada de uma decisão que evitasse a “subida de custos”, mas essa possibilidade não é defendida por nenhum partido político e de facto não existe. Mais uma vez os pressupostos são diferentes. Qualquer decisão neste campo vai representar um aumento dos custos da energia. As pessoas agora sabem isso. O que pode suscitar propostas alternativa são as opções concretas e a distribuição dos custos domésticos. Por exemplo, saber quem paga, se o estado subsidia algumas energia ou são os clientes que pagam a totalidade da energia. As pessoas com menos rendimento terão apoio? É isso que o SPD discute agora. No caso dos custos para as empresas o assunto é mais delicado. O Presidente da República, cuja candidatura eles tinham apoiado, já deu uma valente castanhada nessas pretensões.
O que é decisivo na política actual é apresentação de uma solução viável e consistente para a Energiewende . A encruzilhada diz respeito a quais as soluções que evitem o processo fique paralisado e acautele as melhores decisões para o futuro. A opção de fundo não tem alternativa que se lhe oponha. A única alternativa é uma Energiewende ainda mais rápida. Porém, também seria importante discutir as vantagens enormes deste plano daqui a uns anos e os riscos financeiros da energia nuclear. Quais foram os custos financeiros e económicos da crise em Fukushima ? E os colossais custos não financeiros? Qual a viabilidade da energia nuclear a prazo. Pessoalmente preferia que aqui se tivesse adiado o abandono da energia nuclear para lá de 2022, mas quem contabiliza os custos financeiros do desastre japonês ou de Chernobil tem boas razões.
Pedro,
Distingo “aumentar” de “aumentar significativamente” (60% em 8 anos, na actual situação económica parece-me um exagero). Quando penso em corrigir trajectória (não falo de inversão) penso em ajustar os calendários para não ter impactos destrutivos na Alemanha e por reflexo na Europa – uma coisa é não construir nova energia nuclear outra coisa é ter e não usar. Se ler os argumentos do actual Governo japonês para religar os reactores nucleares da central de Oi vê que o desespero é económico, todos os argumentos estão centrados na competitividade e na perda de emprego.