Dicotomias e maniqueísmos
No mês passado, José Pacheco Pereira chamava a atenção no Abrupto para o seguinte: «Os blogues de jornalistas que são excelentes retratos do que está por trás das notícias, simpatias, antipatias, adesões, ideias, gostos, amizades electivas, ódios de estimação. Eu se tivesse um conselho de prudência a dar a muitos jornalistas portugueses seria o de que nunca, jamais, em tempo algum, escrevessem blogues tão reveladores como, por exemplo, o Glória Fácil ou o Corta-Fitas. Percebe-se tudo bem demais.»
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As reacções, claro, não se fizeram esperar -- por exemplo, Pedro Correia --, ainda que sobre a essência da observação formulada não fosse proferida uma única palavra. Perante a dificuldade em refutar o seu conteúdo, a melhor defesa era o ataque, numa clara manobra de diversão. Na impossibilidade de refutar o teor das críticas, nada como tentar desacreditar o interlocutor...
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Os jornalistas portugueses, em geral, continuam a demonstrar uma enorme incapacidade de aceitar a crítica, independentemente da sua pertinência ou da sua justiça. As críticas e as observações sobre o trabalho dos jornalistas, bem entendido, não são um exercício a preto e branco. Criticar algum do trabalho jornalístico, por exemplo, de Francisco Almeida Leite (FAL), não quer dizer que o mesmo seja um mau jornalista. Esta dicotomia, como instrumento de observação da realidade, é muito pobre, na medida em que na maior parte das vezes as coisas são cinzentas e muito esporadicamente pretas ou brancas. O trabalho dos bons jornalistas, tal como o dos maus e dos assim-assim, não está acima da crítica.
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Como dizia Pacheco Pereira, percebe-se tudo bem demais. As fontes privilegiadas que não se tinha na anterior direcção do PSD, que agora se tem e que não se quer perder, as preferências pessoais e as subsequentes omissões. Alguém encontra uma explicação para o súbito silêncio acrítico de FAL em relação a Luís Filipe Menezes? O que aconteceu à enorme capacidade crítica que FAL sempre demonstrou em relação a Luís Marques Mendes? Evaporou-se, como que por milagre?
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Tudo isto vem a propósito das observações que Pedro Marques Lopes (PML) faz em relação ao Expresso. No momento em que escrevo li apenas por alto a entrevista de Rui Rio. Pessoalmente o que me chamou a atenção foi a pergunta que ficou por fazer: se «os mandatos são para cumprir integralmente, salvo situações muito excepcionais», quais são essas situações muito excepcionais?