Quarta-feira, 05.09.12

A guerra das cleantech (II)

Antecipávamos em finais de Maio que a guerra comercial da UE com a China pelas cleantech (solar) estaria para breve. Conquanto a guerra ainda não esteja instalada, está já na antecâmara desde finais de Julho – com uma queixa apresentada à Comissão Europeia. Uma situação que parece preocupar de sobremaneira a chanceler alemã, que não a desejando, não deixa de avisar a China que tem de fazer concessões. Aguardemos por sexta-feira, data limite para a Comissão Europeia decidir se acende, ou não, o rastilho.

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Terça-feira, 04.09.12

Um desafio

 

Imagine que era desafiado para ajudar a resolver o grave problema de dependência energética da UE, mais concretamente do petróleo. E que lhe davam uma indicação e os seguintes dados: concentre-se nos transportes, estes representam a maior fatia do consumo, aproximadamente 60% do petróleo importado, sendo o principal responsável o transporte rodoviário; no volume de combustíveis consumidos no transporte rodoviário os automóveis ligeiros consomem aproximadamente 30% (gasolina) e outros 30% (gasóleo) ficando os veículos pesados com uma fatia de 40% (gasóleo). Sabendo que no total da Europa há quase 230 milhões de veículos, na sua esmagadora maioria ligeiros: por onde começaria a resolver o problema e onde concentraria os seus esforços?

As respostas, parecendo óbvias, podem não ser dignas de um visionário. A pergunta seguinte é mais difícil: o que podemos fazer ?

 

(continua)

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Segunda-feira, 13.08.12

A quinta coluna

 

A informação que chega do Iraque indica que a violência está novamente a aumentar, os atentados terroristas multiplicam-se evidenciando um crescendo da violência no país. Os reflexos do abandono militar pelas tropas dos EUA no final do ano passado começam, agora, a ser difíceis de esconder. À data o Governo iraquiano enunciava esta mesma preocupação apelando às empresas americanas que não fizessem o mesmo e não abandonassem o país.

O Iraque possui a 3ª maior reserva de petróleo convencional do mundo, no entanto, resultado da história dos últimos anos, hoje apenas produz 4% do petróleo mundial. Estava previsto, após o fim do conflito, que acontecesse no Iraque o maior aumento de capacidade produtiva da história da indústria petrolífera – produzir em 2017 mais 10 milhões de barris. Este manancial de riqueza prometia gerar recursos financeiros suficientes para fazer frente à enorme tarefa que o Governo tem pela frente - a reconstrução do país. Acreditavam os iraquianos (mas também os principais financiadores da intervenção militar) que com uma riqueza tamanha conseguiriam seduzir as maiores empresas petrolíferas mundiais a concorrerem à exploração do potencial energético; e não se enganaram, algumas das maiores estão presentes no Iraque: Exxon, Chevron, Total, Gazprom, CNOOC, Shell, BP, Eni, Sonangol, Statoil. Infelizmente as coisas não estão a correr como o esperado e a maioria dos projectos sofre significativos atrasos, mas pior, são algumas destas empresas que, insatisfeitas com as condições comerciais oferecidas pelo governo iraquiano, assumem uma atitude “rebelde”.

Depois das norte-americanas Exxon e Chevron e da francesa Total terem desafiado o regime, foi na passada semana a vez da russa Gazprom– contrariando as indicações do Governo iraquiano - negociar concessões de exploração de petróleo no Curdistão iraquiano directamente com o Governo Regional do Curdistão, fazendo exactamente aquilo que tinha sido terminantemente proibido pelo Governo central iraquiano. As reservas do Curdistão são significativamente inferiores às das regiões sul do Iraque, razão pela qual alguns analistas entendem que as companhias petrolíferas estão apenas, com esta atitude desafiadora, a tentar pressionar o Governo iraquiano a flexibilizar as condições, isto é: ser mais generoso com a indústria. É óbvio que o Governo central poderá retaliar e retirar as concessões já atribuídas oferecendo-as a outras empresas, nomeadamente chinesas – é uma hipótese, ainda que pouco provável.

Várias consequências podem advir deste comportamento empresarial “rebelde”. Com o atraso no desenrolar normal dos projectos, o Governo central vai sendo privado dos recursos económicos necessários para satisfazer as urgentes necessidades de investimento e mais importante ainda: manter a paz no país e por fim à violência. Sem esses meios, este crescendo de violência que temos assistido, terá tendência a agravar-se.

Esta atitude empresarial não é um desafio unicamente ao Iraque é também à Turquia, e grave, dotar os independentistas curdos de dinheiro não pode deixar de ser lido como uma importante ameaça. Para o Curdistão este facto equivale a um reconhecimento da comunidade internacional, mas com dinheiro.

A estabilização e consolidação da democracia iraquiana devia ser do interesse de todos, contudo, face ao que estamos a assistir, e para alguns, o nível actual de destruição do Iraque parece não ter sido ainda castigo suficiente.

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Terça-feira, 07.08.12

A África subsariana e as "new oil-republics"

Estão identificados uma dezena de futuros petro-estados: Chipre; Etiópia; Guiana Francesa; Israel; Quénia; Moçambique; Serra Leoa; Somália; Tanzânia e Uganda - sete destes Estados estão na África subsariana. O enorme interesse que norte-americanos e chineses demonstram pelo futuro da região não é alheio a este facto.

 

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Sexta-feira, 27.07.12

As guerras do Levante (II)

 

A Europa necessita rapidamente de gás para satisfazer a sua sede de energia, e a sua produção própria está em declínio. São necessários aproximadamente 30 Bcm/ano de capacidade de reserva para não fazer aumentar, ainda mais, a dependência da Rússia. E para estas quantidades, como expliquei no post anterior, não há muitas alternativas – e algumas que havia foram colocadas a hibernar.

Em Dezembro do ano passado falei aqui da ebulição que está a acontecer no Mediterrâneo Oriental onde de repente se preparam para despontarem dois petro-estados: Chipre e Israel. O problema é que ambos disputam com países vizinhos os limites territoriais das suas reservas energéticas o primeiro com a Turquia e o segundo com o Líbano e a Síria.

Estes recursos estão situados no mar mediterrânico, na bacia do Levante onde se estimam que existam reservas de aproximadamente 122 Tcm de gás e 1,7 biliões de barris de petróleo para o conjunto dos quatro países (fonte da empresa americana que ganhou as concessões para a exploração). E aqui, Israel já se antecipou e promete em cinco anos uma capacidade de exportação na ordem dos 20 Bcm/ano na forma de gás natural liquefeito (LNG). Os grandes projectos em curso são Tamar (o mais adiantado) e o Leviathan, onde estão projectadas grandes plantas de extracção e liquefacção de gás para depois o exportar na forma de LNG. Esta opção é aparentemente a mais racional oferecendo a Israel a hipótese de exportar para a Europa ou para a Ásia, onde o gás poderá valer mais. Hoje ninguém parece acreditar na possibilidade de exportação directa deste gás para a Europa por gasoduto terrestre, onde o gás israelita podia competir directamente com o gás russo. E porquê? Porque neste caso teria que atravessar a Síria.

Como todos concordam, um resultado favorável para Israel, da guerra civil na Síria, é a queda do regime e a sua substituição por um menos incompatível – este é um factor decisivo (como se diz em português moderno um gamechanger) neste enorme jogo de interesses económicos. Primeiro, porque pode abrir a alternativa a Israel do gasoduto terrestre passando pela Síria e pelo apetecível mercado turco e com entrada no mercado da UE pela Grécia. Segundo, mesmo com a opção pelo gás natural liquefeito a queda do regime sírio poderá tirar o apoio ao Hezbollah no Líbano, o que para além de aumentar a segurança das fronteiras terrestres a norte de Israel, vai também aumentar a segurança no mar Mediterrâneo protegendo as infraestruturas energéticas de potenciais ataques hostis; e, mais importante, favorecer a negociação das fronteiras marítimas em disputa com os governos do pós-guerra do Líbano e da Síria para a distribuição de tão valiosos recursos energéticos. Quanto à hipótese de um gasoduto submarino que ligue também o Chipre e entre na Europa directamente pela Grécia – pessoalmente, acho que não interessa nem à Turquia e menos ainda aos investidores americanos, pelo facto de passarem ao lado deste enorme mercado e importante aliado.

 

Neste caso, por muito que os média fustiguem a opinião pública mundial com as barbaridades da guerra, a Rússia nunca estará disponível para colaborar – não abrirá de boa vontade o corredor do Levante a Israel e às empresas petrolíferas americanas. As guerras têm sempre uma componente económica, e esta não é diferente.

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Quinta-feira, 26.07.12

As guerras do Levante (I)

 

A Síria é agora a porta que uns querem abrir (ou arrombar) e outros querem manter bem fechada. Muitos perguntam porque se prolonga e agudiza aquela guerra dado que aparentemente não há móbil económico conhecido, porque investem tanto a Rússia como a Turquia naquele país, em lados opostos, porque há homens da CIA e da Mossad também no terreno em apoio aos rebeldes, sem no entanto conseguirem ouvir uma explicação que os satisfaça e que una os pontos. Aviso que não tenho essa pretensão, apenas desejo escrever sobre uma vertente desta complexa guerra.

Muito do que vemos e ouvimos no espaço informativo não ajuda, explica mal o que se está a passar no terreno e muito pouco do que efectivamente acontece nos bastidores da política internacional. A informação que nos chega sobre a guerra civil na Síria merece e deve ser devidamente filtrada; nomeadamente a do mainstream noticioso (da CNN à Al-Jazeera) e das despreocupadas agências noticiosas nacionais.

Uma razão para nós europeus exigirmos ter melhor informação é porque esta guerra ainda nos diz respeito – esta é, também, uma guerra pelo acesso aos mercados europeus e em particular ao mais apetecível de todos: o mercado da energia.

Vejamos então esta vertente da guerra (não sei se a mais importante), o caso concreto do mercado da energia: a Europa é ainda um muito desejado mercado para os países exportadores de recursos energéticos e não está a conseguir libertar-se do espartilho movido há já algum tempo pela Rússia. Face às quantidades em jogo para satisfação das necessidades futuras de energia na Europa, agora que países como a Alemanha, a Bélgica e a Itália desistiram da opção nuclear, poucas são as soluções alternativas aos russos. Na verdade, para as quantidades em jogo, havia apenas duas alternativas aos russos: o Norte de África e o Irão, todas as outras apenas mitigavam o problema. O gás que possa vir de outros países de leste como o Azerbeijão ou do Turquemenistão não ameaça seriamente as ambições de Putin. A Rússia conduz uma estratégia sem diversificação que também a torna, cada vez mais, dependente da cativação da Europa – de quem quer ser o principal fornecedor arriscando a que esta seja o seu principal consumidor. A dependência económica russa dos recursos naturais (energias fósseis), e a falta de mercados de dimensão alternativos à Europa, faz com que o fracasso desta estratégia não seja sequer admissível por Moscovo – poderiam conduzir a convulsões sociais inimagináveis.

A estratégia da Rússia passa por “secar” as alternativas concorrentes através de alianças estratégicas. Depois das alianças com as companhias energéticas alemãs e até mesmo com os governos regionais na Alemanha já conseguiu alianças estratégicas com importantes países europeus, países que podiam oferecer entradas a sul: a Itália e a França. À Itália (à ENI), com o elevado patrocínio de Putin, amigo e aliado indefectível de Berlusconi, foi oferecida participação em importantes investimentos em projectos na Rússia e nos gasodutos que transportarão o gás de leste até à Europa. Com a França foi usada a mesma estratégia e a GDF tem já um importante conjunto de alianças na Europa com a Gazprom. A neutralização destes dois países era importante, ambos podiam oferecer uma alternativa ao gás da Rússia, o gás proveniente do Norte de África, nomeadamente da Argélia, e da Líbia. Sabendo o estado a que foi conduzida a região não é necessário fazer aqui mais desenvolvimentos sobre esta hipótese e a confiança que esta oferece aos investidores.

Sobra ainda a outra alternativa, capaz de satisfazer o apetite energético europeu e competir com os russos: o Irão.

O Irão, por razões sobejamente conhecidas, era até há pouco uma carta fora do baralho para o fornecimento de energia à Europa, até que a Turquia (secundando a China) a resolveu usar. Desde que o poder mudou na Turquia, a sua relação com o Irão tem sido muito ambígua, parecendo acatar as resoluções internacionais mas simultaneamente defendendo-o da aplicação das sanções económicas e até aumentando as trocas comerciais com aquele país. Uma das razões é a sua dependência energética. A Turquia vem mantendo com a Rússia um importante braço de ferro energético (mas também alianças pontuais) e não deseja aumentar o seu grau de dependência - as ambições de potência regional assim o exigem. A Turquia anunciou recentemente um importante investimento – o início da construção de um gasoduto de 5000 km com capacidade para 35 Bcm/ano para simultaneamente importar gás directamente do Irão para o seu mercado interno e exportar para a Europa (o curioso, e para quem não saiba, é que o gás iraniano, ao contrário do petróleo não está sujeito a sanções). A Rússia nunca acreditou seriamente na concorrência iraniana pelo mercado energético europeu, e sempre desconfiou da possibilidade da concretização de uma aliança de iranianos e turcos – a história corroborava esta opinião suportada na falta de confiança mútua. Pode não passar de um bluff de Erdogan, para objectar à decisão russa pelo South Stream, vamos aguardar para ver porque a história não acaba aqui.

 

Por agora, os russos estão demasiadamente concentrados a dificultar a vida a um concorrente de última hora, bem mais credível - o mais recente potencial petro-estado do Mediterrâneo Oriental. Estão a tentar obstruir a entrada do gás de Israel no mercado energético da Europa, pelo corredor do Levante: a Síria. É que Israel, como a Rússia, alimenta a ambição de abastecer a Europa, depois das extraordinárias descobertas de gás na bacia do Levante.

 

No próximo post vou tentar explicar as ambições israelitas e como se cruzam na guerra civil da Síria os interesses opostos de Israel e da Rússia numa violenta guerra que é também económica. Esta é uma das guerras que se trava no Levante.

 

(contínua)

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Sexta-feira, 29.06.12

Habilidade diplomática

De acordo com os dados revelados, a China diminuiu a importação de petróleo do Irão em 25% nos primeiros 5 meses deste ano. Nos EUA, Obama agradece e suspira de alívio - por num período eleitoral não ter que ser consequente com as ameaças que tinha feito. No Irão, este é um sinal ao regime para não tentar forçar o tom das ameaças; e ceder mais vantagens comerciais no sector petrolífero. Habilidade diplomática também é isto: fazer simultaneamente um favor a um adversário e uma advertência a um aliado. O favor será cobrado em breve (como indícia a notícia), a advertência já deverá ter revertido em valor económico.

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Quarta-feira, 27.06.12

Notícias da frente Leste (a Ucrânia)

 

O jornalista Miguel Gaspar tem assinado esta semana no Público uns artigos interessantes sobre a Ucrânia – recomendo a leitura. A Ucrânia é um caso complexo, como explicava um cidadão ucraniano ao jornal de segunda-feira, a Ucrânia é metade Europa, metade Ásia, um país bipolar onde a sua política é um confuso reflexo desta realidade. A União Europeia desejou a inclusão da Ucrânia no seu espaço de influência política e económica, hoje nem tanto, ao contrário, a pretensão da Rússia de a arregimentar para o seu espaço político a leste é continuamente reforçada.

Estou convencido que a União Europeia deu a Ucrânia como um caso perdido, prefere vê-la como aliada da Rússia do que como um factor de instabilidade e perturbação (nomeadamente no fornecimento de gás à Europa). A Ucrânia lê bem estas intenções e acusa a UE, a coberto das boas relações que alguns dos seus Estados Membros mantêm com a Rússia, de a empurrar para os braços do urso. Quem está muito preocupada com tudo isto é a Polónia, preferia não arriscar a ver a Ucrânia ser asfixiada pelo abraço (ao que noticiam, na inauguração do Euro 2012 o indesejado presidente ucraniano passeou-se pelos tapetes vermelhos de Varsóvia).

A verdade é que, a Ucrânia nada fez para confirmar as diversas alianças (económica e energética) que lhe foram oferecidas pela UE – desaproveitou todas as oportunidades e, pior, fazendo uso de manobras simplesmente oportunistas. Agora, se pretendesse voltar atrás provavelmente seria tarde, estou entre os que acreditam que aumentaram, e muito, as probabilidades de a Rússia, após as eleições de Outubro na Ucrânia, fazer uma “tomada hostil” (sem tanques nem violência) à qual a UE vai assistir com uma contida satisfação.

A Ucrânia está falida e o FMI não parece disposto a salvá-la. Actualmente, só o Gazprombank lhe empresta dinheiro e para comprar gás à Rússia, e a Putin já começa a faltar paciência para as fanfarronices de Yanukovych. A conjugação do desespero financeiro da Ucrânia e da dependência energética da Europa vão ditar o salvo-conduto para a Rússia obter, finalmente, o que tanto deseja: o domínio do operador da rede de transporte de gás (o controlo da Naftogaz, o objectivo mais ambicionado); e a participação da Ucrânia numa união económica e aduaneira a leste, juntamente com a Bielorrússia e o Cazaquistão.

Há mais em jogo na Ucrânia do que a partida de hoje e a final do EURO 2012 no próximo fim-de-semana em Kiev.

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Domingo, 24.06.12

Notícias da frente Leste (a Polónia)

 

 

A Polónia e a Ucrânia são por estes dias palco de outras batalhas que não apenas as desportivas. Estes dois países, determinantes para o futuro da União Europeia a leste, travam uma guerra acesa contra a dependência energética da Rússia, as hipóteses de sucesso não são muitas e os aliados também não.

Vejamos o caso da Polónia, país membro da União Europeia. A Polónia não confia em ninguém, nem nos russos nem nos seus parceiros da UE, apenas em si, e talvez nos norte-americanos. Na passada semana, mais uma vez, fez saber que não está disponível para se "suicidar" às ordens da União Europeia. O seu vice primeiro-ministro e ministro da economia reiterou que a Polónia se opõe aos objectivos obrigatórios inscritos no “Energy roadmap 2050”, proposto pela anterior presidência dinamarquesa da UE. Todos os outros 26 membros da UE já apoiaram as conclusões excepto a Polónia. Mais, quer que a UE só se comprometa com novos objectivos, em termos ambientais, após um acordo mundial e que se deixe de voluntarismos – algo que não vai ser fácil, como tivemos oportunidade de ver na Cimeira do Rio+20.

É fácil criticar esta atitude da Polónia, porém não o devemos fazer com leviandade – a situação polaca é bastante complexa e merece ser tratada como um caso singular. O seu sector eléctrico é dependente do carvão em 90% e as alternativas não são muitas, a opção lógica seria o gás natural, mas a Rússia já fornece 60% do gás consumido na Polónia, o restante gás importado vem da Alemanha, e aumentar esta dependência é algo que os polacos assumidamente não querem. O documento que contém a estratégia de segurança nacional da Polónia é claro: “a maior ameaça à segurança nacional do país é a dependência da sua economia de uma única fonte energética externa”.

Os políticos polacos estão conscientes que a actual indústria do carvão está comprometida e que é preciso fazer a reconversão industrial e tecnológica. O que estão a fazer é a comprar tempo, até que tenham condições de prosseguir com outras tecnologias e fontes energéticas alternativas que lhes garantam a segurança de abastecimento e o progresso económico. Diga-se, em abono dos polacos, que alguma coisa tem sido feita: terminais de GNL, interligações por gasodutos com países vizinhos, primeiro país a avançar com a prospecção de gás não convencional (shale gas), tendo também avançado com produção eléctrica com base em energias renováveis e medidas de promoção da eficiência energética. O Governo polaco aprovou em 2009 um documento com a sua política energética até 2030, no qual prevê, por exemplo, que a tecnologia nuclear venha a representar 17% na produção de energia eléctrica (actualmente não existe) – estão a imaginar a irritação que esta medida provoca na sua vizinha Alemanha (até deu origem a uma queixa à Comissão Europeia).

O que os polacos não estão dispostos a fazer é mudanças radicais de acordo com os calendários e os termos delineados em Bruxelas, e a fazê-lo a qualquer preço – arriscando-se a provocar uma convulsão social grave com destruição do importante sector mineiro, são mais de 110.000 trabalhadores.

Mas há um problema sério, onde a oposição da Polónia não é um facto de somenos para as ambições da União Europeia, agora que toda a agenda europeia parece vir a ser apoiada na transição do modelo energético, até a França já veio dar o seu assentimento. A UE está consciente, se quiser avançar por aí, tem de: reformar primeiro o mercado de emissões. A rentabilidade dos novos investimentos em energias renováveis está dependente de um preço do CO2 elevado. Com o actual preço de mercado do CO2 não há o incentivo necessário para o desenvolvimento rápido das renováveis e do gás, ao contrário do carvão que tem queimado bem. O excesso de oferta de licenças e a crise económica afundaram o preço de mercado do CO2, a tocar agora valores na ordem dos 7€/ton. Com este preço do CO2 até o carvão espanhol das Astúrias o único risco sério que enfrenta é o de ser substituído pelo carvão da Colômbia ou da África do Sul ou mesmo da Austrália.

A Comissão Europeia parecia ter um plano para sair deste limbo e iniciar a reforma necessária na cimeira da próxima semana, mas… mais uma vez a Polónia não está pelos ajustes e vai inviabilizar qualquer alteração ao mercado de emissões. Em alternativa, a Comissão accionou o seu plano de contingência e está a estudar formas de contornar as incitativas que necessitem o consenso dos 27. Deve estar preparada para propor uma qualquer medida administrativa que impulsione artificialmente o preço do CO2 para um valor superior aos 20 €/ton, no médio prazo – só assim a “economia verde” pode ter futuro. Esperemos que no desespero de colocar este mercado a funcionar, a UE não condene um dos seus. A Polónia não merece e os riscos podem ser muito elevados, é que o projecto europeu não tem que, obrigatoriamente, começar a desmoronar-se pelo Sul.

Não está fácil a vida na frente Leste, a situação exige flexibilidade táctica e inteligência estratégica. A Ucrânia é uma outra história, fica para outra oportunidade.

publicado por Victor Tavares Morais às 00:31 | comentar | partilhar
Sábado, 16.06.12

Inovação energética e (des)industrialização

 

O Governo alemão está numa verdadeira encruzilhada.

A mudança de política energética pode vir a custar aos contribuintes alemães 15.000 M€ só em indemnizações às empresas produtoras (por acto ilegal de expropriação). O plano de transição energética (Energiewende) está a ser o verdadeiro calcanhar de Aquiles da senhora Merkel dentro de portas. São recorrentes as notícias menos favoráveis sobre a política energética alemã: as indemnizações; a demissão do ministro; as várias empresas que ameaçam fechar ou deslocalizar-se. Por exemplo, a empresa de produção de alumínio Voerdal (3ª maior da Alemanha) que emprega 400 trabalhadores queixa-se que os seus custos com a energia subiram mais de 40% decorrente das mudanças políticas, se o governo da Renânia do Norte-Vestefália não a resgatar vai fechar portas.

O Governo alemão também sabe que a conversão do sector eléctrico para a um sector assente em produção renovável vai necessitar de muitas centrais a gás e para que estas sejam construídas: o mercado grossista de electricidade não chega. O mercado não oferece remuneração suficiente, são necessários outros incentivos, algo semelhante a pagamentos por “serviços de garantia de potência”. Foi isto que concluiu um estudo recente que o próprio Governo encomendou à Universidade de Colónia. Portanto, nada de novo, apenas limitaram-se a obter a credenciação científica da solução – aliás, as empresas alemãs já tinham feito saber que não estavam disponíveis para construir as necessárias centrais a gás, para trabalharem menos de 20% das horas do ano, sem a devida compensação. Outros estudos encomendados pelo próprio Governo também não ajudaram, a McKinsey estima que em resultado do novo modelo energético os consumidores alemães vão pagar em 2020 mais 60% pela energia que consomem, passando dos actuais 13.500 M€/ano para 21.500 M€/ano (não inclui a indústria).

Ao contrário do que possa parecer, este não é apenas um assunto de política interna, este tema deve preocupar os demais países europeus, um factor de agravamento significativo nos custos da energia pode tornar a Alemanha bastante sensível à crise económica actual e fazer piorar ainda mais a situação no resto da Europa.

Quer o Governo alemão corrigir esta trajectória? Ainda tem espaço de manobra? Cada vez menos.

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Reactivados

 

Com a chegada dos consumos de Verão e a economia a sofrer com os preços da energia, o primeiro-ministro japonês não teve alternativa e autorizou a religação de dois reactores nucleares.

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Terça-feira, 12.06.12

Cheira a gás e a dinheiro

 

Está a rodar “Promised Land”, um filme político que promete não passar despercebido. É um filme que tem o actor Matt Demon como cabeça de cartaz e cujo argumento foi escrito por ele em conjunto com John Krasinski. Este é o filme de maior orçamento alguma vez realizado sobre a indústria do gás nos EUA – neste caso a nova indústria do gás de xisto (shale gas). Não são conhecidos muitos detalhes do filme, apenas se sabe que estão a terminar a rodagem na cidade de Apollo, no estado da Pensilvânia.

Hollywood entrou no jogo político e apostou na controvérsia causada pelo tema da exploração de gás. Depois de “Gas Land” (2010) - um filme de Josh Fox imbuído de muito activismo mas que conseguiu, apesar de tudo, ser nomeado para os Óscares, tendo perdido para o famoso documentário "Inside Job". Agora com a entrada de Hollywood as apostas subiram, é um outro campeonato.

As dificuldades para a indústria do gás, após a exibição e divulgação de “Promised Land”, vão ser maiores do que em 2010. O impacto internacional do filme também não é de desconsiderar. No entanto, os produtores do filme querem fazer crer que não há uma tomada de posição, mas ninguém parece acreditar. É óbvio que, para além de algum activismo com que possa vir embrulhado o filme, a indústria cinematográfica também o faz neste momento por dinheiro.

 

Mas a entrada de Hollywood na polémica é meritória. Só uma indústria muito poderosa, como é a indústria cinematográfica americana, pode pretender desafiar a ainda mais poderosa indústria da energia. O poder do lobby da indústria americana da energia era até há pouco tempo inabalável, os muitos milhões gastos com políticos e advogados garantiam à indústria um estatuto de "intocáveis" - as coisas têm mudado muito, mas Hollywood pode acelerar a mudança. Repito as palavras de um profissional americano da indústria quando instigado a falar do tema – “O lobbying já não chega, os políticos e os advogados já não nos podem garantir o futuro, temos que ir falar directamente com as pessoas e explicar-lhes o que estamos a fazer, e como lhes poderemos melhorar a vida”. Agora vai ser uma luta dura, com muita demagogia à mistura, mas antes assim.

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Domingo, 10.06.12

Inovação energética e industrialização

 

 

 

Temos ouvido falar muito de inovação a propósito das energias renováveis em função de avanços tecnológicos e de novas aplicações comerciais. Mas parece agora consensual que as grandes inovações tecnológicas na área da energia, na primeira década do novo século, são na (menos sexy) família das energias fósseis. Refiro-me ao gás não-convencional, e ao gás de xisto (shale gas) em particular.

Duas inovações tecnológicas tornaram possível esta revolução que não foi previamente anunciada, e que permitiu a exploração de gás de xisto em volumes considerados comerciais: a perfuração horizontal (horizontal drilling); e a fracturação hidráulica (fraccing). Não querendo aborrecer o leitor com questões técnicas relativas à exploração deste gás, deixo aqui um vídeo didáctico (descontem a propaganda).

Aquilo que não se adivinhava no início do século XXI era o impacto desta tecnologia no mercado de gás nos EUA. Uma revolução tipicamente americana. O gás de xisto que era menos de 1% da produção de gás norte-americana em 2000 é actualmente mais de 30% e pode chegar muito em breve aos 50%. Nada fazia prever esta revolução, tudo indicava que o preço do gás seguiria em crescendo e que os EUA seriam um grande importador de gás natural liquefeito (GNL). Diversos projectos foram então desenvolvidos tendo por premissa económica a satisfação do mercado norte-americano, como foi o caso dos terminais de regaseificação nos EUA, os últimos trens de liquefacção no Qatar, e do ainda por inaugurar - Angola LNG. Mas a revolução do gás de xisto modificou tudo: o Médio Oriente está agora a fornecer a Europa e a Ásia; e Angola prepara-se para fazer o mesmo.

O impacto do gás de xisto no mercado dos EUA tem sido extraordinário. O mercado está inundado de gás e isto tem um consequente reflexo nos preços: o preço do gás já atingiu a barreira dos 2 $/MMBtu nos EUA (Henry Hub); enquanto na Europa está a cotar perto dos 9 $/MMBtu (NBP); e no Japão a atingir os 18 $/MMBtu. Observem bem: o gás no Japão custa agora 9 vezes mais do que nos EUA, isto é uma enorme vantagem competitiva da economia norte-americana.

Infelizmente os benefícios desta saturação de gás do mercado norte-americano, e o consequente preço reduzido do gás, não foram extensíveis aos demais mercados porque não é actualmente possível aos produtores americanos exportarem o gás em forma de GNL. Coisa que indianos, japoneses e até espanhóis andam à procura, assinando contratos promessa para fornecimento futuro. Países importadores e produtores americanos de gás todos pressionam agora a administração Obama para que permita a exportação do gás. Mas alguns economistas, industriais americanos (das industrias de energia intensiva) e alguns políticos não estão dispostos a permitir que isso aconteça – prevendo que o gás suba no momento que estiver disponível a exportação.

Um forte argumento para não deixar que a exportação aconteça, é o da reindustrialização americana com a “gaseificação da economia” (conversão dos transportes e da produção de electricidade), mas também o repatriamento de industrias e empregos, que se deslocalizaram para outros países na procura de energia mais barata. Não faz a reindustrialização e o repatriamento de emprego quem quer, mas quem tem argumentos económicos para isso. E os americanos têm agora um: energia barata. Tem-se observado, por exemplo, o regresso de algumas indústrias americanas, que deixaram a América do Sul e o Oriente e regressaram aos EUA.

De acordo com algumas estimativas optimistas o baixo preço do gás é sustentável, e pode conduzir, nos próximos anos, a um adicional no crescimento do PIB americano equivalente a quase 2% ao ano. Pode Obama arriscar uma decisão que contrarie isto – e permitir a exportação de gás -ficando conhecido como o destruidor do mais promissor agente de crescimento económico e do renascimento industrial americano? Provavelmente não, vai tentar uma situação de compromisso; e só vai permitir a exportação de uma pequena quantidade de gás americano.

 

Também a Europa está preparada para propor a inovação energética como base do seu modelo de crescimento e emprego. O modelo americano tem uma grande vantagem perceptível: o preço da energia - é claro, e qualquer industrial vai entender no momento de tomar uma decisão. E quanto à Europa, quais são afinal os argumentos económicos para suportar o emprego (criado ou devolvido) e o investimento com base na nova revolução energética? Duvido que no modelo europeu o preço da energia venha a ser o argumento em jogo, mas seria bom que outros argumentos surgissem, e mais importante: que sejam entendidos e apreciados por aqueles que fazem os investimentos e criam ou transferem os empregos.

 

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Sábado, 05.05.12

Energiewende

 

Fritz Vahrenhold  é um cientista e político alemão (SPD), e desde 2008 CEO da empresa de energias renováveis do grupo empresarial alemão RWE, foi também um herói do movimento ambientalista em 1978 quando publicou um livro muito crítico da indústria química. Mas após a publicação do seu último livro “Die Kalte Sonne” (O Sol esquecido) em que desalinha do consenso na questão das alterações climáticas, mesmo sendo presidente de uma grande empresa de energias renováveis, foi de imediato acusado pelos movimentos ambientalistas alemães de ser um “lobista” a favor da indústria das energias fosseis (a RWE é também o maior electroprodutor alemão na tecnologia de centrais eléctricas a carvão).

 

Esta semana Fritz Vahrenhold deu uma entrevista à Energy Policy Review, a qual pode ser lida aqui. O mais interessante da entrevista é a crítica que Vahrenhold faz ao plano energético de transição alemão (Energiewende). É um plano irracional que, nas suas palavras, ameaça destruir a indústria que está na base da prosperidade económica alemã. E pior, ao contrário do que possa ser percepcionado pela opinião pública, o plano alemão não congrega uma visão europeia sobre a energia e o ambiente, reflecte apenas uma perspectiva egocêntrica, isto é, não tem um contexto europeu (conclusão minha). A Alemanha avançou para a implementação de um plano desta dimensão sem primeiro se concertar com os seus vizinhos, o que é, no mínimo, um acto de enorme arrogância e uma asneira grosseira. 

 

So how can Germany get out of this dead end?

 

-The exit is Europe. The Energiewende should be a European task. It makes no sense to do it with solar power in Flensburg Solar when you can do it in Andalusia for one third of the cost. Wind energy in the Po delta in Italy makes no sense either. But before we can do it on a European scale we need a pan-European grid. Building such a grid will take us at least twenty years. “

 

 

Infelizmente, para os federalistas europeus mais optimistas, a Alemanha dá hoje todos os sinais (na área da energia…) de não saber o que é uma comunidade. Independentemente da qualidade do plano energético alemão, a sua reflexão e acção nesta área enquanto país, são ainda caracterizadas pelo mesmo grau de independência e autonomia que observávamos na grande nação alemã do final do século XIX, e nunca as que deviam qualificar um Estado de uma futura federação europeia do século XXI. 

publicado por Victor Tavares Morais às 08:56 | comentar | ver comentários (5) | partilhar
Sexta-feira, 04.05.12

..., Zero

 

Amanhã, dia 5 de Maio vai ser desligada a única central nuclear japonesa em funcionamento e pela primeira vez em décadas o Japão não terá um único reactor nuclear (dos 54 existentes) em funcionamento para produção de energia eléctrica. Mas a transição energética, sem nuclear, pode vir a revelar-se muito difícil.

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publicado por Victor Tavares Morais às 19:12 | comentar | ver comentários (3) | partilhar
Sábado, 28.04.12

O abraço do urso

 

Para quem tem estado atento às questões europeias a leste, tem sido óbvio o clima de conflito permanente que a Polónia alimenta com a União Europeia a respeito das questões energéticas e ambientais. Questões essas que vão do número de licenças de emissão de CO2 ao desmantelamento do parque electroprodutor a carvão, até à legislação relativa à exploração de hidrocarbonetos. Em suma, a Polónia sente hoje pouca compreensão por parte de União Europeia no seu esforço para não cair numa maior dependência energética da Rússia. Outros países de leste também enfrentam este enorme desafio, o de se libertarem do estado de dependência do gás Russo, nomeadamente a Ucrânia e a Hungria. A Bielorrússia parece já dominada e confortável com a situação de dependência relativamente a Moscovo.

 

O propósito destes países é não só político mas também económico. O gás russo é tradicionalmente vendido em contratos de longo-prazo, a um preço em que a indexação ao petróleo pesa mais de 85%. A Ucrânia paga hoje preços de gás natural superiores a 400 $/m3 (valor que é superior em dobro ao que pagam os seus vizinhos da Bielorrússia) e a sua vasta rede de gasodutos é “sucata” se por ela não transitar gás em direcção à Europa. A relação energética da Rússia com a Ucrânia relativamente ao preço do gás tem oscilado entre a negociação e a ameaça dos tribunais arbitrais, no entanto os ganhos para os ucranianos são duvidosos. Em Abril de 2010 o presidente Yanukovych da Ucrânia e Dmitri Medvedev assinaram o Acordo de Kharkiv (pura ironia, a cidade onde Yulia Tymoshenko está presa) que garante aos russos a permanência por mais 25 anos da frota do Mar Negro na região da Crimeia, em troca de um desconto no preço do gás, mas os termos deste acordo permanecem no maior dos secretismos.

 

Uma alternativa recente oferecida a estes países para os aliviar do espartilho russo é a auto-produção, nomeadamente de gás não convencional: o shale gás (gás de xisto) e também o CBM (coal bed methane). A Polónia leva a dianteira com duas dezenas de furos de prospecção realizados e ambiciona começar a sua exploração do gás de xisto dentro de 3 a 4 anos, já a Ucrânia anunciará em Maio as empresas vencedoras para a exploração do mesmo gás nas duas zonas geológicas de maior potencial, mas a exploração comercial só será possível dentro de 5 a 7 anos.

 

Sem a ajuda europeia, estes países contam com os Estados Unidos que deslocaram para a região um contingente de empresas, com competências e tecnologia na área do gás não convencional, para permitirem a revolução desejada. Os EUA não querem arriscar perder a zona tampão que separa a Rússia da Europa Ocidental, na qual a Polónia é absolutamente determinante em termos geoestratégicos.

 

A Rússia e a Alemanha (a UE é aqui um “sleeping partner” instrumental), pelo vector da energia, estão a realizar uma estratégia voluntária de tenaz que ambiciona a asfixia económica dos países da antiga órbita soviética, no sentido de os conduzir de volta e pelos próprios pés à esfera de que se tinham libertado. Vamos ter que voltar a estudar a história das relações internacionais na Europa de Bismarck, porque é este o modelo que as elites na Alemanha e na Rússia tanto ambicionam, e não o escondem – uma relação bilateral das duas potências continentais europeias sem intermediação, nem de Bruxelas nem de Washington. A oeste e pela via da dependência financeira a Alemanha também tem vindo a construir a sua órbita de dominância política e económica – mas esta realidade é-nos menos estranha.

 

Hoje, começa a ficar evidente que a Rússia está apostada em abraçar energeticamente a Europa. Os russos estenderam um primeiro braço energético pelo norte até à Alemanha e fizeram com os alemães o gasoduto do Mar Báltico (o “Nord Stream” – para contornar a Ucrânia e a Polónia) sem Bruxelas ser tida ou achada, agora o mesmo está a acontecer com o “South Stream” (um outro gasoduto para contornar a Geórgia e a Turquia pelo Mar Negro) e deram a conhecer esta semana que a construção vai ter início ainda este ano. É o braço sul, que entra pela Bulgária e que vai ser estendido até à Itália e à Grécia, terminando na Áustria. O que também parece evidente é o propósito dos russos em minar o principal projecto energético com patrocínio europeu: o Nabucco.

 

Enquanto o kzar e a chanceler negoceiam e decidem o futuro da Europa, em Bruxelas legisla-se sobre o superior interesse das galinhas poedeiras. Não há o risco de, no imediato, a União Europeia se converter num clube de desocupados – não é ainda a preguiça e o ócio que a ameaça: é a irrelevância.

publicado por Victor Tavares Morais às 08:22 | comentar | ver comentários (8) | partilhar
Sábado, 21.04.12

Dois modelos e um abraço

 

Está aí a eleição presidencial francesa, e ao contrário do que inicialmente parecia ser um factor distintivo dos candidatos, o modelo energético francês não chegou a ser seriamente posto em causa. Com Sarkozy e Mélenchon claramente do lado pró-nuclear, François Hollande limitou-se a um acordo com os ecologistas para uma redução da dependência energética francesa da energia nuclear dos actuais 75% para os 50% em 2025 – a montanha pariu pouco mais do que um rato. Ficou claro, mesmo antes de conhecermos os resultados eleitorais, que a França vai manter o seu modelo energético. Do outro lado está a Alemanha, que fez saber no ano passado que iria desactivar as suas centrais nucleares até 2022. Parece evidente que vamos ter na Europa, pelo menos, dois modelos energéticos distintos, o francês e o alemão. No “clube francês" alinham o Reino Unido, a Holanda, a Polónia e a República Checa, do lado alemão, parecem já estar cativados: a Áustria, a Suíça e a Itália.

 

Se em França é a manutenção do status quo, e portanto a incerteza não é condição determinante, já o modelo alemão convoca aos especialistas e políticos todas as dúvidas e perplexidades – Como vai um país altamente industrializado revolucionar o seu modelo energético sem comprometer a sua competitividade económica? Qual o significado político desta mudança? O objectivo alemão é de ter 30% de renováveis até 2020 e 100% em 2050. A produção renovável vai exigir uma capacidade de “back-up” muito considerável que só as centrais a gás parecem poder oferecer, o que também significa, que o modelo energético desejado vai deixar a Alemanha ainda mais dependente do gás russo.

 

Com a mudança do modelo energético alemão, algo muito significativo poderá estar a acontecer na Europa – uma maior aproximação de Berlim a Moscovo, com todas as implicações políticas daí decorrentes. O que ontem poderia parecer ter carácter especulativo, com a saída de Gerhard Schröder directamente da chancelaria alemã para a petrolífera russa, tem hoje da observação dos factos recentes, um significado muito concreto. Por exemplo, quando a Rússia desvia, desde o início deste ano, parte significativa do gás com destino à Alemanha dos gasodutos ucranianos (privando a Ucrânia dos proveitos desse trânsito) para o recentemente construído gasoduto russo do Mar do Norte (Nord Stream), que liga a Rússia directamente à Alemanha.

 

Em breve, ao abraço do urso poderão sucumbir a leste, por asfixia económica, países como a Ucrânia, mas desenganem-se, os que pensam que não é nada connosco - o “bafo” do urso também se fará sentir a oeste.

(continua)

publicado por Victor Tavares Morais às 09:58 | comentar | ver comentários (7) | partilhar
Terça-feira, 27.03.12

Presidenciais, gasolina e geopolítica

Um artigo de Daniel Yergin publicado no dia 16 de Março no WSJ.

 

As in the 2008 presidential election—remember the chants of “Drill, baby, drill!”—rising oil and gasoline prices have become an issue in 2012. But election-year politics aside, the forces driving up prices at the pump are very different today than they were four years ago. In 2008, it was primarily the surge in oil consumption in emerging markets, disruptions, and a belief that the world was running short of oil (the so-called peak oil crisis).

 

In 2012, the reason is mainly geopolitics.

(…)

A market this tight would already be susceptible to upward price pressures. But the market is operating on expectations that supplies will become even tighter as new U.S. and European sanctions against Iran take effect and the risk of military conflict increases. Put simply, the oil market is reading the front page.

 

Given these circumstances, there's not much Washington can do in the short term to reduce prices at the pump.

 

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publicado por Victor Tavares Morais às 22:56 | comentar | partilhar
Quinta-feira, 09.02.12

Realpolitik der Energie

The cold snap gripping Europe has forced Germany, which decided last year to abandon nuclear power, to bring several reactors back on line, the daily Handelsblatt reports in its Thursday issue.

 

publicado por Victor Tavares Morais às 12:58 | comentar | ver comentários (2) | partilhar
Segunda-feira, 06.02.12

Déjà vu

 

Mais uma vez, a Rússia faz a Europa tiritar de frio e demonstra que energia é poder. São já oito os países europeus a sofrer com a redução do gás russo. Pelo meio, a Rússia aproveita para acertar contas com a Ucrânia a quem acusa de ficar com o gás destinado à Europa, em trânsito nas redes ucranianas (80% do gás russo transita pela Ucrânia). E Putin também não perde uma oportunidade para nos recordar que o eixo do poder na Europa ainda é Paris-Berlim-Moscovo. Está na hora de alguém na UE prestar contas, mas como isso provavelmente não vai acontecer, a Polónia e os demais vão encontrar fortes razões para continuarem a afirmar uma política energética à revelia do directório europeu.

publicado por Victor Tavares Morais às 14:23 | comentar | ver comentários (7) | partilhar

Cachimbos

O Cachimbo de Magritte é um blogue de comentário político. Ocasionalmente, trata também de coisas sérias. Sabe que a realidade nem sempre é o que parece. Não tem uma ideologia e desconfia de ideologias. Prefere Burke à burqa e Aron aos arianos. Acredita que Portugal é uma teimosia viável e o 11 de Setembro uma vasta conspiração para Mário Soares aparecer na RTP. Não quer o poder, mas já está por tudo. Fuma-se devagar e, ao contrário do que diz o Estado, não provoca impotência.

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