E eis os juros das obrigações gregas ultrapassaram hoje os 100%. O governo alemão já fala abertamente num default ordeiro na Grécia, para estabilizar o euro
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1. Parece que se estar a formar um consenso acerca da oportunidade da emissão das eurobonds. Espanta-me ver tanta e tão boa gente a concordar com esta irresponsabilidade (já nem falo de socialistas e comunistas que apenas pretendem uma forma de continuar a saga despesista). Já não se recordam das origens desta crise? Eu dou uma ajuda. Lembram-se do subprime? Dos títulos de alto risco que eram vendidos no meio de outros com risco reduzido e recebiam ratings AAA e ajudaram a disseminar a crise? Para os mais esquecidos este artigo do WSJ compara-os às eurobonds e avisa-se que isto pode criar uma crise ainda maior que a actual. Depois não se queixem.
2. A sério. Não percebo os apelos para que se evite a todo o custo o default da Grécia. Na prática, a Grécia já não tem dinheiro para pagar as suas obrigações e está a viver à custa de mais empréstimos dos credores. Na prática, estamos apenas a substituir dívida privada (maioritariamente de bancos) por dívida pública (dos restantes países-membros). Estamos a agravar a factura da Grécia e potenciar crises de finanças públicas noutros países da UE. Como diz o director-geral da PIMCO, se queremos evitar o efeito dominó devemos deixar falir Grécia, Irlanda e Portugal.
Vamos lá ver se percebi a ideia. Os bancos aceitam que a Grécia entre em incumprimento se as agências de notação fingirem que esta continua a pagar a tempo e horas. As agências de notação só param de fingir que a Grécia tem capacidade para redimir a sua dívida no minuto em que esta deixar de a pagar aos bancos.
Começou finalmente a reestruturação da dívida grega: Banca alemã estende prazo de reembolso de dois mil milhões de euros de dívida grega. É expectável que náo fique por aqui. Será alargado o prazo de pagamento noutras maturidades e não é de esperar que venha a ser perdoada parte significativa da dívida. Como explica aqui, de forma simples, o João Miranda a reestruturação não vai significar o fim das austeridade. Apenas permitirá que a dívida desça para níveis sustentáveis. E vai ter implicações extremamente graves no acesso aos mercados de dívida. Convém não esquecer.
E nós estamos estamos já a seguir. "Para o fundo de cobertura de risco LNG, a movimentação que agora se observa no mercado obrigacionista mostra que os investidores estão a começar a antecipar que a Irlanda e Portugal poderão ter de persuadir também os detentores de dívida irlandesa e portuguesa a proceder também a um “rollover” das obrigações que detêm destes dois países."
A propósito de um recente estudo do Open Europe sobre a sustentabilidade da ajuda à Grécia, Daniel Hannan especulasobre as razões que levam à demora da UE e BCE em aceitar a necessária reestruturação da dívida grega. O quadro supra pode-nos ajudar a entender a razão. Essencialmente, o efeito do pacote financeiro do FEEF/FMI será proceder à alteração da estrutura dos credores. Os grandes beneficiários serão as instituições financeiras (em especial as estrangeiras) que verão as sua exposição substancialmente reduzida em detrimento das entidades públicas (UE, BCE e FMI). O mesmo é dizer que os bancos que estão a beneficiar de um novo "bailout" à custa dos contribuintes. Mais uma vez a irresponsabilidade do sector bancário que alimentou as políticas suicidas nos países periféricos sairá recompensada. Tal como nota Hannan, esta operação de substituição de dívida vai demorar algum tempo pelo que, entretanto, a dívida grega (e a conta dos contribuintes) irá crescer mais um pouco.
Para quem se quiser inteirar acerca da razão da recente (melhor dizendo, continuada) crise grega aconselho a leitura deste Q&A de Edmund Conway no Daily Telegraph. Não restam grandes dúvidas que o melhor caminho a seguir será preparar urgentemente uma reestruturação ordenada da dívida grega (obrigando os credores a assumir parte dos custos) antes que sejam atingidos por um default bem mais grave. Contrariamente à tese popularizada pela extrema-esquerda, a reestruturação não é o "fim da história" nem permite o fim da austeridade (*). Até porque às já impossíveis condições de financiamento vão piorar ainda mais pelo que continua a ser necessário o programa de assistência financeira da UE/FMI. E vai continuar a ser necessário colocar as finanças do estado grego num caminho sustentável e mesmo com a reestruturação o stockde dívida acumulado vai continuar a ser colossal. Aliás, tal como Conway (e não só) sugere provavelmente a reestruturação não será suficiente e assistiremos à expulsão do Grécia da zona euro readoptando uma moeda (bastante) desvalorizada. O empobrecimento vai ser brutal. Tal como o enriquecimento era artificial.
Em Portugalficaremos (espero) pela reestruturação e pelo rigoroso programa de ajustamento. Não sendo tão mau como as provações que esperam os gregos não vai ser mesmo fácil.
(*) A este propósito leiam o Impertinências.
Numa carta enviada ao BCE e aos parceiros da zona euros, o ministro das finança alemão constata o óbvio. Contrariamente ao programa é impossível que a Grécia regresse aos mercados já em 2012. Como tal e para evitar que a Grécia falhe as suas obrigações com o credores (o famoso "default") propõe que os actuais detentores de dívida grega sejam obrigados a aceitar uma extensão do prazo de reembolso por 7 anos (ie na prática a reestruturação da dívida - o "haircut"). Para além de dar mais tempo ao governo grego para implementar as reformas - e para que estas comecem a produzir resultados (*) - permitirá uma redistribuição dos encargos do plano de ajuda (o "bailout") assumindo os privados parte dos custos (**).
(*) Parece que os socialistas portugueses esperavam que o defunto PEC IV tivesse um impacto significativo em apenas 15 dias.
(**) Ao contrário de José Sócrates que sempre defendeu que deviam ser os contribuintes a pagar a totalidade da conta
Nota: A notícia no Público.
As declarações de José Sócrates sobre a possibilidade de reestruturação da dívida soberana portuguesa são mais uma confirmação daquilo que o Miguel Morgado escreveu sobre a "politização extrema do debate sobre a crise portuguesa" levada a cabo pelos socialistas. Reparem que, embora uns a considerem um instrumento necessário e outros como a solução final, em todos os partidos esta questão é equacionada. Excepto no PS onde quem ousa abordar o tema é prontamente escorraçado para os o rol dos traidores ao líder e à Pátria. José Sócrates amarrou o PS a uma posição irredutível que o colocará numa posição extremamente desconfortável quando chegar à nossa vez. E ela chegará. Não tenham dúvidas.
Nota: Ainda a propósito de reestruturações. Só agora é que a Moody's se apercebeu que é bastante provável a reestruturação da dívida grega. A Standard & Poors e a Fitch ainda devem estar a ponderar essa possibilidade. Mais uma "prova" que foram as notações que precipitaram a crise. Isto, se quiserem continuar a ignorar os factos.
Este post do Rui Peres Jorge explica na perfeição o nervosismode Paulo Macedo, administrador do BCP, com uma eventual reestruturação da dívida dos países periféricos. Um corte de 50% na valor da dívida grega (um valor perfeitamente plausível) implicaria um "rombo" de 350 milhões de euros no activo do BCP. Não custa imaginar a hecatombe provocada por um "haircut" (ainda que inferior) na dívida portuguesa. Durante anos, um sistema de garantias explícitas e explícitas e o laxismo dos bancos centrais e agências de notação incentivou durante anos os bancos a financiaram alegremente o despesismo público e privado sem se preocuparem grandemente se estes tinham ou não capacidade de pagar. Eles próprios endividaram-se enormemente a fim de poderem beneficiar destas "fabulosas oportunidades de negócio. Para grande "surpresa" de todos descobre-se agora que o risco foi subavaliado e nem o estado nem os privados têm capacidade para pagar as dívidas. Como se não tivessem tido quaisquer responsabilidades no processo pretendem agora que sejam os contribuintes a pagar pelos seus erros. Reestruturação? Devia até ser proibido falar no assunto!
Segundo Jean Claude Juncker, mesmo com a ajuda externa e os programa de austeridade o nível de endividamento da Grécia é insustentável e terá de obter receitas extraordinárias e cortar custos privatizando grande parte do sector público . Não que a solução apontada me faça grande espécie. Aliás acho que é uma medida fundamental e não apenas por razões de solvabilidade. (e não me refiro apenas à Grécia). O problema é que julgo que a mistura de baixo crescimento económico, austeridade, elevado stock de dívida e a elevada taxa de juros da "ajuda" têm-se revelado altamente tóxico e implica a manutenção do pais num ciclo vicioso do qual será impossível sair. (a mesmíssima lógica aplica-se a Portugal). Já é mais ou menos consensual que o "bailout" falhou e que se torna imperativo reestruturar a dívida forçando os credores a assumir (com toda a justiça, diga-se) uma parte dos custos. Por enquanto os máximos responsáveis políticos ainda rejeitam essa ideia (embora já manifestem alguma abertura). Mas lá chegaremos.