E, de repente, depois de uma entrevista de António Borges, um coro de vozes se levantou apontando o problema da falta de competitividade das empresas portuguesas (i.e., do país): os altos salários pagos. Por acaso (ou não) o coro de vozes fez-se mais ouvir em jornalistas, comentadores e políticos do que em empresários.
Ora bem: sendo certo que os salários em Portugal aumentaram mais nos últimos anos do que a produtividade - o que tornou as empresas portuguesas progressivamente menos competitivas - só alguém alucinado pode supor que o problema dos salários é o fulcro da falta de competitividade nacional. Tirando na administração pública, nas empresas públicas, em institutos e fundações públicas e nas grandes empresas privadas geridas como se fossem públicas, a política de ordenados é geralmente conservadora e anda perto da produtividade de cada um (e se alguém pensa que todos os custos das empresas com a absurda legislação laboral do país - que pouco mudou com este governo - não se reflectem também em ordenados mais baixos, esse alguém vive noutro planeta).
O problema fulcral da falta de competitividade das empresas é o Estado gordo e mastodôntico que temos, não os salários. O problema da falta de competitividade do país são as leis absurdas, muito lindas em teoria e catastróficas na prática (onde se enquadra, com direito ao quadro de honra, a legislação laboral), não os salários. A TSU é um problema de competitividade do país. A legislação laboral é outro. A (In)justiça, que tudo faz para penalizar as empresas, mais um. Os custos fiscais das empresas (sejam em IRC, taxas e taxinhas, impostos sobre produtos petrolíferos que tornam tudo mais caro por via das matérias-primas ou dos custos de transporte, IVA em taxas alucinantes, e um largo etc.) são pouco menos que mortais. A hiper-regulamentação controleira asfixia qualquer empresa. E por aí adiante.
Mas, claro, como já passou quase um ano desde a tomada de posse deste governo e ainda nada foi feito para reduzir de forma estrutural a despesa pública (apenas se implementaram medidas pontuais e facilmente reversíveis de redução de despesa), nada faz prever que o governo pretenda prescindir da sua colecta. Donde: é necessário tapar o sol com a peneira e distrair os tolinhos com um suposto problema nacional, de forma a que ninguém perceba que o problema é e continua a ser o estado, que faz tudo e culpa todos para evitar emagrecer.
Enfim, esta discussão dos salários tem um bom resultado. Geralmente considera-se que o estado socialista que temos apenas vai atrás dos 'ricos' (e 'ricos' do ponto de vista de quem ganha o ordenado mínimo). Talvez agora se perceba que o estado (ou quem dele se aproveita), para evitar reformar-se, irá atrás de quem seja necessário, mesmo de quem ganha 700 euros brutos por mês. Chama-se a isto socialismo e é nisto que temos votado.